Tactear o transitório. Ser fulguração. Sentir o esgar da revolta, da ironia, do espanto...

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Spinning...
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Ela agora dorme como se fosse inverno e estivesse a hibernar. Já em novita era do contra.
Há que aproveitar o tempo livre como se ele não existisse.

Em Setembro, o filho mais novo entra no mundo mágico da escola dos grandes «aquilo é enorme, mamã!». Tendo já arrumado a pasta das fitas de finalista dos júniores, agora cheira, deliciado, todos os livros novos antes de lhe pesarem na mochila. E mal acredita quando ela lhe diz que vai passar a almoçar na escola, num pronto a comer igual áquele onde, várias vezes, almoçam juntos. E que, ainda por cima, tem ele de escolher o que quer, pagar e carregar com o tabuleiro. Coisinhas assim, fundamentais, que os miúdos invejam quando percebem que há um mundo onde ainda não pertencem: a da auto-suficiência dos adultos.
Continua bonito, doce - apesar duma força secreta muito grande e dum mundo ainda maior - e a querer ser médico para tirar a dor às pessoas e tratar a imortalidade por tu.
E, sem se aperceber, a dizer que não com um gesto de cabeça, quando vê as atrocidades das guerras na televisão.
Um anjo a quem a maldade, que lhe esteve tão próxima, não venceu.

Este mês, o filho mais velho comprou um quase-topo-de gama-quase-novo-para-estar-quase- sempre-na-garagem. Está quase-um-homem, portanto. E a achar que não se gasta um euro em nada que não valha a pena e que não seja bom. Trouxe essa capacidade de avaliação do pai. E o materialismo. A mãe, só tarde demais começou a fazer contas consigo. Era uma mãos largas. Quer as coisas valessem a pena ou não.
Continua fiel ao namoro que já dura há anos. Ansiedades e sonhos à parte, herdou isso dos dois.
Fica um executivo lindo quando veste o fato das reuniões de trabalho. De resto vai de calções trabalhar, se lhe apetecer. Continuando distinto, como sempre.
A faculdade é para se ir fazendo. Esta é aquela etapa inesquecível em que se pensa que a vida só começou agora e é muito grande.
Ela olha para ele e pensa que, apesar dos pesares que não se esquecem nem se desculpam, tem orgulho naquela sua obra acabada e amassada com mãos de vazio, com força de contra tudo e todos e olhos brilhantes de insónias e ternuras. Podia não ter sido assim, mas os resultados acabaram por compensar.

O calor agrava o estado em que se encontra. Quer que chegue a noite embora já saiba que a vai detestar como últimamente acontece. E que vai engolir poções de esquecimento. Afinal a magia acaba sempre por acontecer a quem sonha que a vida é um jogo de Playstation, cada vez mais elaborado, com que os entes celestiais ocupam a eternidade.

Falta pouco para dia 4 de Setembro. Ao fim de tantos anos decidiu ir a um concerto naqueles sítios gigantescos, sózinha, rodeada de gente anónima por todos os lados. E escapar sem morrer de aflição. Mas se morrer será como viveu: sem contradições, alone with her strong emotions and dazzed by careless words.
She'll be dressed in canvas ( Sheets of empty canvas, untouched sheets of clay...). E, já que as boquilhas jazem numa caixinha qualquer no sotão das coisas de décadas, vai levar uns binóculos old fashion. Para além daquela quelque chose que talvez acabe por achar que ainda tem, junta o útil ao agradável. Não há óculos com lentes suficientemente experientes para conseguirem ver se a idade não venceu Vedder. Ou para estender a mão e limpar-lhe a testa. Ou simplesmente para lhe agarrar nos cabelos e fazer-lhe um caracol com os dedos. Ou para lhe fazer lembrar alguém ou ela nesse alguém, o que é mais ou menos o mesmo.
Os encantamentos são coisas muito esquisitas. Sobretudo quando têm como objectos pessoas.

Ela vai tomar o seu Earl Grey. Isto passa-lhe já.
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20 Julho 2006

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