Tactear o transitório. Ser fulguração. Sentir o esgar da revolta, da ironia, do espanto...

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Deixa lá, querida
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Um post que me tocou, do blog " Vamos lixar tudo". Um post do qual alguém que conheço diria "Merdas que me dizem algo..."
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“Estou a aprender a estar comigo só”, dizia-me ela. E eu que a queria e ela não queria crer em tal desejo. Senti-me subitamente expulso do mundo dela, ao mesmo tempo que ela me continuava a consentir que mergulhasse os meus olhos nos olhos dela.
“Por vezes é preciso sonhar e amar em voz alta”, resmunguei eu. Não disse ai, nem ui.
Continuámos a jantar e no fim acendemos os inevitáveis cigarros pós-refeição.
Insisti. Acariciei-lhe a face. E ela deixou. Os dedos descaíram um pouco até ao pescoço. E ela deixou-os chegarem até aos seios.
Talvez com a excitação daqueles mamilos duros, ela agarrou-me, beijou-me e acariciou-me os cabelos.
Já deitados no sofá, em frente à televisão que passava um filme que não víamos, as carícias subiram de tom. Amámo-nos no chão como dois adolescentes, inocentes e inconscientes.
Deixa que continue assim, deixa lá, querida.
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31 Julho 2005

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Olhares no Fundo da Pele
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-Nunca mais caminhámos pelas ruas, nunca mais nos sentámos a olhar o azul do céu. Cansaço, indiferença?
-Apenas desejo que não te sintas presa.
-Eu quero sentir-me presa, conscientemente presa. Cair contigo, Leo.
-Umas vezes queres, outras vezes procuras a luz.
-Pensas então que eu...que perdemos a luz?
-Caminhávamos pelas ruas e o tempo não contava. Ainda te vejo, ainda te sinto transparente. Mas chegámos demasiado cedo à vida do outro.
-Tu é que falas em acabar, que tudo acaba, amor efémero e não sei que mais...
-Precisamos de novas ressonâncias, de ouvir cada um a sua música.
-Eu não preciso, Bach está bem.
-Queres dizer que ainda não precisas. Um dia destes farás amor comigo a pensar noutro.
-Um dia em que estejas a pensar noutra?
-Ou noutra coisa. No vazio.
-Não estás sempre? Essas figuras que tens na cabeça, esses palcos que tu pisas...
-O começo da tua libertação. A morte do casamento, Ema.
-Que já morreu para ti.
-Começou a morrer.
-Quando?
-No primeiro dia. O teu é imutável?
-Está de boa saúde, cheio de contradições mas...
-Vês? -Cheio de contradições, infidelidades, mas o desejo...
-O desejo? Sabemos onde tocar, sabemos quando o outro deseja, quando o outro se abre. A isso eu chamo hábito, conforto, um conforto -que pouco a pouco se tornou maduro. Como tu me desprezarias se eu te fosse fiel! Leal, sou leal.
-Dás-me vontade de rir.
-Ri. Gosto de te ver rir assim, com o copo na mão, a olhar o mundo com o copo na mão.
-O mundo, o mundo...Só devia ser olhado, só merece ser olhado com o olho do cu. Prefiro olhar para ti.
-Para mim? Estou feia.
-Chegou o momento de te conheceres, de te possuíres.
-Tu é que te perdeste. Às vezes olho-te e não te reconheço.
-Eu sei. Eu próprio me perco nos meus desertos. Jogo a mão, tenho a boca seca e é uma miragem. Ainda não encontrei o meu kibbutz.
-Tocas o que a mão não alcança.
-Alcanço-te ainda.
-Não gosto do ainda.
-Queres que me apodere do futuro, do que não existe?
-Eu não existo?
-Existes mas não tens olhos, não vês que estou a cair, a deslizar. Não vês o medo que eu tenho de ser tão incerto e deslizante e falso como tudo o resto. O amor é sempre uma forma de destruição.
-Quando começámos dizias que era uma forma de construção...
-Sabes qual é a diferença?
-Sei que me queres perder.
-Não se ama menos quem está ausente, quem se perdeu.
-Palavras. Tão vazias como o azul do céu, um buraco. Mas eu estou aqui, ainda estou aqui.
-Ainda, estamos ainda ligados um ao outro mas já não temos nada a construir.
-Eu tenho. Ajudas-me a despir o vestido?
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in Pátria Sensível : Romance
Casimiro de Brito

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13 Julho 2005

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