Tactear o transitório. Ser fulguração. Sentir o esgar da revolta, da ironia, do espanto...

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19:40
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o relógio da estação marcava

dezanove e quarenta

um alto e entroncado homem
sorria de um dos lados da linha

todos os dias

do outro sorria uma mulher
com os seus dezanove
e quarenta anos

a reter, os brincos da mulher
estridentes de silêncio

e as botas dele
invulgarmente mudas

a dilecção dela
eram homens pontuais

a dele mulheres
sorridentes ao silêncio

dia dezanove de um mês
invernoso
do ano de quarenta

de um lado da linha
não havia vislumbre
de mulher ou homem

e do outro
também não
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Nuno Travanca

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30 Novembro 2006

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Orgia Vocabular
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Ainda em maré de poesia, isto está genial.
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27 Novembro 2006

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"Um dia, sonhei que acordava" - Mário Cesariny
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Todos Por Um
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A manhã está tão triste
que os poetas românticos de Lisboa
morreram todos com certeza

Santos
Mártires
e Heróis

Que mau tempo estará a fazer no Porto?
Manhã triste, pela certa.
Oxalá que os poetas românticos do Porto

sejam compreensivos a pontos de deixarem
uma nesgazinha de cemitério florido
que é para os poetas românticos de Lisboa
não terem de recorrer à vala comum

Mário Cesariny (1923-2006)
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26 Novembro 2006

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Balas de insulto
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um fusil com
balas de insulto pede-me
a pontaria certa para a queda.

a ferida entreaberta que desce o corpo,
atabalhoadamente,
sem cores, talvez rubra,
talvez não, chama-me.

doem-me as mortes, até as verdadeiras.
como se fossem falsas,
como se me agonizassem sem que eu peça que mintam.

são mentira, as balas de insulto, de fel insulto.
é mentira a arma com que se dispara a emoção, ou as rajadas de emoção.

a inércia dá à costa, e as lágrimas dispõem-se em areal para a receber.
então eu marco um lanche na minha agenda.
um lanche comigo mesmo, ao qual não chegarei a tempo.
tenho fome, tenho fome de um fusil de verdade.
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Nuno Travanca
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26 Novembro 2006

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Sai das minhas noites
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Não quero ninguém a contemplar os meus sonhos carcomidos pela sede.

Não me apetecem os teus olhos. Não me apetece água.

Quero-me de volta aos meus sonhos sem movimento.

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26 Novembro 2006

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As Irmãs Mirabal ou "Mariposas" e o Dia Internacional da Não-Violência contra a Mulher
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Foto deste blog (a visitar)
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Patria, Minerva e María Teresa Mirabal nasceram em Ojo de Agua, província de Salcedo, República Dominicana. Estas irmãs e os maridos, Pedro González, Manolo Tavarez Justo e Leandro Guzmán, tiveram a valentia de lutar pela liberdade política de seu país, opondo-se firmemente contra uma das tiranias mais férreas da América Latina, a de Rafael LeonidasTrujillo. Por esta atitude foram perseguidas, presas várias vezes e, por fim, brutalmente assassinadas.

Patria Mercedes: nasceu a 27 de Fevereiro de 1924, data da Independência da República Dominicana, motivo pelo qual recebeu o nome de Patria. Artista por natureza, desde pequena tinha afeição pela pintura, na qual se refugiava nos momentos íntimos e trágicos de sua vida, criando obras de singular beleza, ternura e harmonia. Terminado o liceu e apesar de não ter frequentado a Universidade, a sólida base de educação familiar converteu-a numa mulher culta e desenvolta socialmente. Casou-se muito jovem, com 17 anos, tendo tido 4 filhos. Sofreu todo o rigor e brutalidade da tirania, vendo destruído o seu lar, mas o seu carácter doce e terno não a arrastou pela via da amargura. Estava consciente de sua luta.

Minerva Argentina: nasceu a 12 de Março de 1926 e desde a infância destacou-se pela sua inteligência. Em 1946 terminou o Bacharelato em Letras e Filosofia. Os amigos admiravam-na e gostavam dela pelo seu carácter jovial, alegre e sincero e respeitavam-na pela sua inteligência e amplos conhecimentos culturais. Formada, posteriormente, em Direito, a quem Trujillo não queria entregar o diploma e quando o fez não lhe permitiu exercer a carreira, era uma estudante fora de série. Tinha um carácter firme e decidido. Na Universidade conhece o marido, com quem casa em 1955, tendo-lhes nascido 2 filhos. Tinha sido presa já em 1949 e 1951, e foi também em Janeiro de 1960 juntamente com o marido, Manolo - lider do Movimento político "14 de Junho" - e seus cunhados. Nesse mesmo ano foi libertada e voltou a ser presa, com a sua irmã Maria Teresa. Foi condenada a 5 anos de prisão, pena que foi reduzida para 3 depois de ter recorrido da sentença. Hoje, a Facultade de Ciências Jurídicas da Universidade Autónoma de Santo Domingo, a mais antiga do Novo Mundo, tem o seu nome. _
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Antónia Maria Teresa: a mais jovem, nasceu a 15 de Outubro de 1936. Mimada pelos pais e irmãs, inteligente e dedicada aos estudos, em 1954 termina o Bacharelato em Matemáticas. De seguida ingressa na Facultade de Matemáticas da Universidade de Santo Domingo e obtém o título de Agrimensora, a inteligentíssima Engenheira Civil. Em 1958 casa-se e, no ano seguinte, é mãe. Tenaz, valente e atrevida, foi presa pela primeira vez a 20 de Janeiro de 1960. Levada à fortaleza militar de Salcedo, foi posta em liberdade nesse mesmo dia, para ser presa novamente no dia seguinte. Foi libertada a 7 de Fevereiro. A 18 de Março, mesmo sofrendo de uma bronquite aguda, é presa novamente. Junto com Minerva e outros companheiros, é condenada a cinco anos de prisão, pena que foi reduzida, em apelação, para três anos.

A 25 de novembro de 1960, quando as três irmãs Mirabal regressavam de Puerto Plata, onde se encontravam presos os seus maridos, foram detidas na estrada, num lugar denominado "La Cumbre", e brutalmente assassinadas por agentes do SIM (Serviço de Inteligência Militar) do governo de Trujillo, tendo sido simulado, depois, um acidente. Este horroroso assassinato produziu uma condenação geral da comunidade nacional e internacional em relação ao governo dominicano, e acelerou a caída do ditador Rafael Leonidas Trujillo.

Em homenagem às irmãs Mirabal, feministas reunidas no Primeiro Encontro Feminista Latino-americano e do Caribe celebrado em Bogotá, Colômbia, em 1981, decidiram instaurar o 25 de Novembro de cada ano como "Dia da Não Violência à Mulher". Posteriormente, em 1999, as Nações Unidas oficializaram esse dia como "Dia Internacional da Não-Violência contra a Mulher".

As irmãs Mirabal são também conhecidas e representadas como as "Mariposas", por ter sido este o nome secreto de Minerva nas suas actividades políticas e clandestinas contra a tirania Trujillista. Que homenagem fazer a estas mulheres Mariposas, além de continuar a lutar contra todas as formas de violência, em especial contra todas as formas de violência em relação às mulheres? Talvez nada melhor para homenagear hoje as irmãs Mirabal senão exaltando as palavras daquele que lhes fez a mais bela das homenagens: Pedro Mir, o grande poeta nacional dominicano, que no seu poema "Amém de Mariposas", de 1969, expressa de forma singular, única e poéticamente eternizada o que significou a tragédia do assassinato das três heroínas.
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Fonte: CLADEM - Comité Latino-Americano e do Caribe para a defesa dos direitos da mulher
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Há cerca de 1 ano, na 2, foi transmitido o filme sobre a vida destas irmãs e toda a envolvente política da época, naquele país. Gostaria de revê-lo, sobretudo porque só o “apanhei” quase a meio.
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Em Portugal e noutros pontos do mundo converte-se este acontecimento para 24 de Novembro, e não 25, baptizando-o de Dia Internacional contra a Violência Doméstica, querendo assim abranger crianças e idosos. Ou seja, violência entre 4 paredes. O que, parecendo que não, é reduzir e desvirtualizar o real significado deste dia. São problemas diferentes, e se um cabe noutro, o contrário não é verdadeiro. Inventem mais dias. Que tal todos?
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25 Novembro 2006

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Sem comentários
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No dia em que, aqui e em muitas partes do mundo, se assinala o Dia Contra a Violência Doméstica, violência que vitima, esmagadoramente, as mulheres, a RTP1, a 2, a TVI, a SIC e a SIC Notícias dedicaram algum espaço, por pequeno que tenha sido, nas suas programações, com documentários, reportagens e notícias com as vitímas desse crime ou sobre ele.
A SIC Mulher, não.
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25 Novembro 2006

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Só falta um bocadinho assim....
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20 Novembro 2006

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E, então, o todo será mais que a soma das partes.
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Deve haver outra maneira de encaixar as peças, deve haver outro quadro possível.

Eu tenho que montar um puzzle que não me deixe recortada aos pedaços.
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20 Novembro 2006

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Wounds 7
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Poema de Domingo

Quando chega domingo,
faço tenção de todas as coisas mais belas
que um homem pode fazer na vida.

Há quem vá para o pé das águas
deitar-se na areia e não pensar…
E há os que vão para o campo
cheios de grandes sentimentos bucólicos
porque leram, de véspera, no boletim do jornal:
« Bom tempo para amanhã»…
Mas uma maioria sai para as ruas pedindo,
pois nesse dia
aqueles que passeiam com a mulher e os filhos
são mais generosos.
Um rapaz que era pintor
não disse nada a ninguém
e escolheu o domingo para se matar.
Ainda hoje a família e os amigos
andam pensando porque seria.
Só não relacionam que se matou num domingo!
Mariazinha Santos
(aquela que um dia se quis entregar,
que era o que a família desejava,
para que o seu futuro ficasse resolvido),
Mariazinha Santos
quando chega domingo,
vai com uma amiga para o cinema.
Deixa que lhe apalpem as coxas
e abafa os suspiros mordendo um lencinho que sua mãe lhe bordou,
quando ela era ainda muito menina…
Para eu contar isto
é que conheço todas as horas que fazem um dia de domingo!
À hora negra das noites frias e longas
sei duma hora numa escada
onde uma velha põe sua neta
e vem sorrir aos homens que passam!
E a costureirinha mais honesta que eu namorei
vendeu a virgindade num domingo
— porque é o dia em que estão fechadas as casas de penhores!

Há mais amargura nisto
que em toda a História das Guerras.

Partindo deste princípio.
que os economistas desconhecem ou fingem desconhecer,
eu podia destruir esta civilização capitalista, que inventou o domingo.
E esta era uma das coisas mais belas
que um homem podia fazer na vida!

Então,
todas as raparigas amariam no tempo próprio
e tudo seria natural
sem mendigos nas ruas nem casas de penhores…

Penso isto, e vou a grandes passadas…
E um domingo parei numa praça
e pus-me a gritar o que sentia,
mas todos acharam estranhos os meus modos
e estranha a minha voz…
Mariazinha Santos foi para o cinema
e outras menearam as ancas
— ao sol
como num ritual consagrado a um deus! —
até chegar o homem bem-amado entre todos
com uma nota de cem na mão estendida…

Venha a miséria maior que todas
secar o último restolho de moral que em mim resta;
e eu fique rude como o deserto
e agreste como o recorte das altas serras;
venha a ânsia do peito para os braços!

E vou a grandes passadas
como um louco maior que a sua loucura…
O rapaz que era pintor
aconchegou-se sobre a linha férrea
para que a morte o desfigurasse
e o seu corpo anónimo fosse uma bandeira trágica
de revolta contra o mundo.
Mas como o rosto lhe estava intacto
vai a família ao necrotério e ficou aterrada!
Conheci-o numa noite de bebedeira
e acho tudo aquilo natural.
A costureirinha que eu namorei
deixava-se ir para as ruas escuras
sem nenhum receio.
Uma vez que chovia até entrámos numa escada.
Somente sequer um beijo trocámos…
E isto porque no momento próprio
olhava para mim com um propósito tão sereno
que eu, que dela só desejava o corpo bom feito,
me punha a observar o outro aspecto do seu rosto,
que era aquela serenidade
de pessoa que tem a vida cheia e inteira.
No entanto, ela nunca pôs obstáculo
que nesse instante as minhas mãos segurassem as suas.
Hoje encontramo-nos aí pelos cafés…
(ela está sempre com sujeitos decentes)
e quando nos fitamos nos olhos,
bem lá no fundo dos olhos,
eu que sou homem nascido
para fazer as coisas mais heróicas da vida
viro a cabeça para o lado e digo:
— rapaz, traz-me um café…
O meu amigo, que era pintor,
contou-me numa noite de bebedeira:
— Olha,
quando chega domingo,
não há nada melhor que ir para o futebol…
E como os olhos se me enevoassem de água,
continuou com uma voz
que deve ser igual à que se ouve nos sonhos:
— …. no entanto, conheço um homem
que ia para a beira do rio
e passava um dia inteirinho de domingo
segurando uma cana donde caia um fio para a água…
… um dia pescou um peixe,
e nunca mais lá voltou…
O pior é pensar:
que hei-de fazer hoje, que toda a gente anda alegre
como se fosse uma festa?… —
O rapaz que era pintor sabia uma ciência rara,
tão rara e certa e maravilhosa
que deslumbrado se matou.

Pago o café e saio a grandes passadas.
Hoje e depois e todos os dias que vierem,
amo a vida mais e mais
que aqueles que sabem que vão morrer amanhã!

Mariazinha Santos,
que vá para o cinema morder o lencinho que sua mãe lhe bordou…
E os senhores serenos, acompanhados da mulher e dos filhos,
que parem ao sol
e joguem um tostão na mão dos pedintes…
E a menina das horas longas e frias
continue pela mão de sua avó…
E tu, que só andas com cavalheiros decentes,
ó costureirinha honesta que eu namorei um dia,
fita-me bem no fundo dos olhos,
fita-me bem no fundo dos olhos!

Então,
virá a miséria maior que todas
secar o último restolho de moral que em mim resta;
e eu ficarei rude como o deserto
e agreste como o recorte das altas serras:
e virá a ânsia do peito para os braços!

Domingo que vem,
eu vou fazer as coisas mais belas
que um homem pode fazer na vida!
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Manuel da Fonseca

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20 Novembro 2006

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Tired off
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Ter sido sempre a mesma que sou hoje - e tão diferente daquela que fui. Sou uma, digo eu: sou uma e a seguir sou a outra. Ora uma, ora a outra. Há tão poucas coisas a dizer. Dizemos tudo o que podemos. E nada é absolutamente verdade, seja o que for.
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20 Novembro 2006

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We will not always have Paris
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Quando chegaste eu estava preparada, à tua espera. Surpreendi-te, disseste. Mas eu não sabia onde estavas. Numa península de medo?
Recebi a tua dor enquanto te pedia os lábios para os meus, saturados de curvas secas. Não sei o que me pedias em troca desta sede. Ou o que eu podia querer receber. Ficava afogueada quando me inspiravas. Deste-me o brilho misterioso e o silêncio. E não entendeste o bem que me fazia receber essa luz dolorosa de quem tinha a morte nas mãos e ao mesmo tempo a euforia no sangue espalhado por feridas que jamais ousaste contar. Sonhava ser-te bálsamo.
Mas ficaste quieto e mudo. Fugir de mim era o teu alfa e ómega. E eu enfiei a dor numa luminosidade cambiante que nunca mais apaguei na alma. E beijei outros lábios (como ousaste queixar-te ou criticar-me?). E quando te queria recuperar acendia a tua imagem - a que me deste em tanto tempo intermitente (de amor? tu não acreditas no amor) - e reescrevia as nossas palavras.

Tu, que me poderias ter lavado a febre nocturna de querer dar vida a um pesadelo; que, com esses olhos suaves e medrosos, me poderias acender o fogo na água; tu, que me poderias dissolver este coágulo de raiva, ficaste ausente e nem sonhaste o quanto vivi a atrasar o fim, na esperança de te encontrar no abraço que nos faria um.
Mas há um destino preso nesta teia de acasos. Eu disse-te. Hoje continuo a ouvir o pânico camuflado nas tuas palavras. Nem isso, apenas o sinto. E vejo-te avançar e recuar. Como sempre.
Eu, eu deito-me contigo mas nunca te toquei. Acordo e olho para ti mas nunca abres os olhos. Tomo banho e sei que não me vês.
Sei que acordas, hoje, de noite, sem sentires os lençóis molhados do suor que levavas de mim.


Passaram anos. Desisti do teus braços. Desisti duma certeza nos teus passos. Aprendi que nunca é uma palavra que se pode dizer. E eu nunca quis , nem quererei, o que quer que seja que não possa, nem queira, ser só meu.

Um pensamento, que seja.
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20 Novembro 2006

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Errata
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Onde se diz "Mais vale só que mal acompanhado" deve dizer-se "Mais vale mal acompanhado que só".
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19 Novembro 2006

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se quisesses ter visto, comigo...
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...o tempo que passou com tudo lá dentro, eu seria cetim.

tu, que eras o mar para a minha sede, a mão nos meus cabelos molhados e o meu conto para adormecer.
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19 Novembro 2006

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Infinito
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Os amores sem esperança nunca terminam.
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Sándor Márai, A herança de Eszter
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19 Novembro 2006

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Prefira o produto nacional
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O Código D'Avintes: romance
O mistério da infância de Jesus Cristo acaba por ser revelado nas margens do Douro
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Tudo começa em torno da trama sinistra do Conclave dos Cavaleiros Teutónicos da Nova Ordem que quer dominar o mundo sem olhar a meios.
Isaías Pires, professor de medicina expulso da Ordem por práticas pouco ortodoxas, pertencente a outra organização que se opõe aos intuitos pérfidos do Conclave, sofre um trauma e desata a falar aramaico, língua corrente no tempo de Cristo na Palestina, e logo a seguir começam a morrer patos e pombos por todos os cantos.
De repente, todos os personagens, o anjo Gabriel e a sua Sara, Lilith, delirante diva, a Arminda do bar do hospital, o doutor Fraga, a padeira de Avintes, o ex-inspector Nuno Costa, o professor Aquilino, especialista em línguas mortas, e outros mais, bons e maus, desatam a procurar antiquíssimas relíquias sagradas que podem conferir um poder indescritível àqueles que as possuírem.
O cúmulo é que a chave do código para chegar a essas relíquias está escondido justamente numa bela terra à beira do Douro e que, por isso mesmo, ficará para sempre conhecido por O Código d'Avintes.

in O Código D'Avintes
Romance da autoria de Alice Vieira, João Aguiar, José Fanha, José Jorge Letria, Luísa Beltrão, Mário Zambujal e Rosa lobato Faria
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17 Novembro 2006

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Parabéns
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A um senhor. Sim, tu, Saramago.

Não pelos prémios, não pelos anos. Sim por seres assim. Por saberes explicar daquela maneira de se falar para todos, a diferença entre instruir e educar. De sentir válidas as pequenas batalhas que, sobre isso, já travei nas escolas dos meus filhos. Por me teres feito chorar, ontem, na tua saudade das oliveiras perdidas, que de tantas e tão grandes se perdiam de vista...

"E agora? Para onde vão os lagartos?"...

Este mundo já não é casa para ninguém. Não se respira. Não se contempla de baixo para cima.

Se me conhecesses não ias gostar de mim. Era bem capaz de te dizer que nunca te tinha lido. Que nem tinha o rádio do carro quase no volume máximo e uma lágrima teimosa ao canto do olho quando anunciaram o teu Nobel. Não ias saber que eu tenho este defeito de sobranceria distante - defesa, ataque - frente a quem está acima dos outros, num ou noutro contexto. Ou talvez percebesses que isso é apenas a mão que quero dar a quem está lá em baixo, e não desagrado pela grandeza.

Não importa. Eu não importo. Só se um dia me despir de sentimentos inúteis, desgastantes e imerecidos e souber escrever sobre como era, antes, o sítio onde vivo agora; um enorme monte repleto de árvores e flores com um moinho branco no cume, de velas também brancas sempre a girar colado ao azul claro do céu, onde mães e filhos subiam todos os anos, religiosamente, no dia da espiga para depois desceram de lá com a certeza de que se vivia uma liberdade perfumada. Se souber transmitir aquela sensação, de tantas tonalidades, do vento que me batia na cara quando subia mais e mais alto no baloiço que era de todos.

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16 Novembro 2006

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De Gramática e de Linguagem
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"E havia uma gramática que dizia assim:
"Substantivo (concreto) é tudo quanto indica
Pessoa, animal ou cousa: João, sabiá, caneta".
Eu gosto das cousas. As cousas sim !...
As pessoas atrapalham. Estão em toda parte.
Multiplicam-se em excesso.

As cousas são quietas. Bastam-se. Não se metem com ninguém.
Uma pedra. Um armário. Um ovo, nem sempre,
(Ovo pode estar choco: é inquietante...)
As cousas vivem metidas com as suas cousas.
E não exigem nada.
Apenas que não as tirem do lugar onde estão.
E João pode neste mesmo instante vir bater à nossa porta.
Para quê? Não importa: João vem!
E há de estar triste ou alegre, reticente ou falastrão,
Amigo ou adverso...João só será definitivo
Quando esticar a canela. Morre, João...
Mas o bom mesmo, são os adjetivos,
Os puros adjetivos isentos de qualquer objeto.
Verde. Macio. Áspero. Rente. Escuro. luminoso.
Sonoro. Lento. Eu sonho
Com uma linguagem composta unicamente de adjetivos
Como decerto é a linguagem das plantas e dos animais.
Ainda mais: Eu sonho com um poema
Cujas palavras sumarentas escorram
Como a polpa de um fruto maduro em tua boca,
Um poema que te mate de amor
Antes mesmo que tu saibas o misterioso sentido:
Basta provares o seu gosto...
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Mário Quintana
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16 Novembro 2006

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Not wounds
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Munch- Vampira
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16 Novembro 2006

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Play it again, Sam
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22:00 horas - 09/08/2003 - 1ª página

" Que tendência para o kitsch, minha querida - mas Deus sai-se sempre em kitsch, não é verdade?"

in Fazes-me falta - Inês Pedrosa

Esta aflição de não saber o que pensas...não o que fazes ou farás, só o que pensas.Revejo os GNR no Coliseu. Sorrio perante o que, recentemente, designaram de preciosidade: «tu sabes lá, isso não existe à venda, diz quanto queres, eu compro» e que, afinal, está num estado lastimoso depois de centenas de visionamentos. Salva-se o Reininho na sua melhor época, a genialidade do Tóli, a loucura daquele puto de Lisboa na guitarra ( que será feito dele?)

Julieta Su e Sida...

A vida tem momentos únicos, inebriantes, digo eu, ainda com alguma lucidez, depois de um deles. Hoje, a caminho do trabalho, sem nenhum trânsito nem ninguém à vista no horizonte, agarrada ao volante, pescoço recostado, fechei os olhos. Desafio, tipo jogo «desta vez quero só sentir a red line, sem a ver». Lembro-me duma leveza inenarrável, duma paz desconhecida, lembro-me de ter pensado tantas vezes no desejo de morrer contigo, mais do que viver, ( as dissertações sobre a vida e sobretudo sobre a morte são o absinto dos poetas e dos filósofos...) e que, afinal, podia morrer ali, sózinha, sem ninguém saber porquê. Talvez tu soubesses, só tu, a alma, neste mundo, mais atormentada que a minha e que, apesar disso, consegue descer lá da tese sobre Verdade e Existência para logo a seguir brincar com as palavras e rir como um anjo - ou arcanjo, que é um grupo mais restrito. Vi a minha avó a levar-me o pequeno almoço à cama com a mesma seriedade com que me segurava quando eu me agarrava, a chorar, às pernas da minha mãe quando ela e o meu pai saíam, à noite, e eu não compreendia porque não me levavam. Lembrei-me do M. e da ventania que fez no dia do nosso casamento e de como o meu véu de sete metros se enrolava à volta dele durante as fotografias e de como ele se ria disso e de como eu estava aborrecida porque uma fotografia, para mim, naquele dia, era uma coisa solene. Lembrei-me do despertar do meu 1º parto, «está tudo bem, o menino está bem, descanse» e de mo trazerem horas depois, de olhar para ele e de pensar que não era assim muito diferente o sentimento daquele outro que tive quando soube que estava grávida, quando soube que tinha um filho em mim, esse sim, um momento único, porque ver, para mim, nunca foi tão importante como saber e sentir.

Voltaste-me de novo, naquele beijo até onde eu não sabia que existia, na doce ingenuidade de pensares que me vais ter por me tocares, qual menino em frente a uma montra de inacessíveis brinquedos que não sabe ainda que o momento da criação deles foi o momento em que eles lhe pertenceram.

Aqui abri os olhos e vi que estava a meio das faixas de rodagem sem me ter apercebido do desvio e sorri «assim não tive medo»E pensei (ainda) em ti e em como pensarias na tua responsabilidade no facto de eu desafiar a morte sem saberes que a verdade reside só em eu ter nascido a sentir demais a vida para a querer, para gostar dela ( os ditos populares, que desprezamos, sabem «tudo o que é demais...» )

Julieta Su e Sida...afinal era um bilhete só de ida, só se pagava uma vez...

Estou sózinha. «Tenho de comer qualquer coisa», penso, mas estou neste enleio, tão antigo e há tanto tempo interrompido, de escrever, de amar as palavras com que sou feita, as palavras do que vivi. Vou parar, prosseguirei mais tarde... ( 1ª regra dos decadentes ). Porque me fui lembrar dos decadentes e do Mário de Sá Carneiro ? E porque sinto, de repente, as interligações de tudo isto? Declamá-lo-ia para ti, lânguidamente estendida no sofá como se fosse numa cama de hospital. E depois talvez pusesse, no vídeo, um dos dois filmes da minha vida. Podia ser o Les uns et les autres, para desejar ver-te chorar comigo na cena final, tão majestosamente longa e intensa. E para desejar ver-me chorar ao fazer, depois, amor contigo.

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15 Novembro 2006

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Se tu me esqueces
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Quero que saibas uma coisa. Tu sabes como é:
se contemplo a lua de cristal, os ramos rubros do outono lento da minha janela,
se toco ao pé do lume a impalpável cinza ou o corpo enrugado da lenha,
tudo a ti me conduz, como se tudo o que existe, aromas, luz, metais,
fossem pequenos barcos que navegam em direcção às tuas ilhas que me esperam.


Ora bem, se a pouco e pouco deixas de amar-me,
deixarei de amar-te a pouco e pouco.
Se de repente me esqueceres, não me procures, que já te haverei esquecido.
Se consideras longo e louco o vento de bandeiras que percorre a minha vida
e decidires deixar-me à margem do coração em que tenho raízes, pensa
que nesse dia, nessa hora,
levantarei os braços e as minhas raízes irão procurar outra terra.


Mas se em cada dia, em cada hora, sentes que a mim estás destinada com doçura implacável.
Se em cada dia em teus lábios nasce uma flor que me procura,
ai, meu amor, ai, minha, todo esse fogo em mim se renova,
em mim nada se apaga nem se esquece,
o meu amor do teu amor se nutre, amada, e enquanto viveres continuará
nos teus braços sem abandonar os meus.
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Pablo Neruda
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14 Novembro 2006

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Amores: todos diferentes, todos iguais?
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Não sei.

Há os que nos tocam nas fantasias e se assustam. Os que batem e fogem antes de vermos quem é. Os que ficam, teimosamente, em crosta sobre o nosso peito. Os que nos rasgam os véus e conseguem ver-nos brilhar.

Amor-amado é sempre aquele que nos anda a bailar nos lábios e ainda não nos respondeu.
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14 Novembro 2006

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A metáfora
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No ano passado escrevi um poema que começava assim:"sinto a lâmina do teu ciúme no meu peito" - era uma metáfora, claro. E não suspeitei.
Agora, que me espetaste a faca de descascar batatas entre as costelas, único desfecho lógico para o nosso amor; agora, que sinto a lâmina e o sangue morno a alastrar-me na camisa, sei, finalmente e tarde demais, a fraca expressividade das metáforas.
Por isso, se ainda gostares um bocado de mim, pede para, na segunda edição, alterarem o verso para:"sinto o teu ciúme como uma lâmina no meu peito".

José Luís Peixoto
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14 Novembro 2006

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Great expectations
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Nada garante que tu existas.
Não acredito que tu existas.

Só necessito que tu existas.

David Mourão Ferreira
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12 Novembro 2006

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Shivering
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12 Novembro 2006

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Instinto fatal
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Era uma vez duas serpentes que não gostavam uma da outra. Um dia encontraram-se num caminho muito estreito e como não gostavam uma da outra devoraram-se mutuamente. Quando cada uma devorou a outra não ficou nada. Esta história tradicional demonstra que se deve amar o próximo ou então ter muito cuidado com o que se come.

Ana Hatherly
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12 Novembro 2006

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You have the key to my pleasure
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11 Novembro 2006

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Wounds 6
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Quase
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Um pouco mais de sol - eu era brasa
Um pouco mais de azul - eu era além
Para atingir, faltou-me um golpe de asa
Se ao menos eu permanecesse aquém
Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num grande mar enganador de espuma
E o grande sonho despertado em bruma
O grande sonho - ó dor! - quase vivido
Quase o amor, quase o triunfo e a chama
Quase o princípio e o fim - quase a expansão
Mas na minh'alma tudo se derrama
Entanto nada foi só ilusão!
De tudo houve um começo ... e tudo errou
- Ai a dor de ser - quase, dor sem fim
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim
Asa que se enlaçou mas não voou
Momentos de alma que desbaratei
Templos aonde nunca pus um altar
Rios que perdi sem os levar ao mar
Ânsias que foram mas que não fixei
Se me vagueio, encontro só indícios
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas
E mãos de herói, sem fé, acobardadas
Puseram grades sobre os precipícios
Num ímpeto difuso de quebranto
Tudo encetei e nada possuí
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi
Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além
Para atingir faltou-me um golpe de asa
Se ao menos eu permanecesse aquém
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Mário de Sá-Carneiro

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11 Novembro 2006

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Este blog não é só amor e desgraças afins
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Parabéns aos democratas americanos
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na Câmara dos Representantes

e no Senado

Isso passa, Georginho, bebe mais um copo.

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09 Novembro 2006

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last words (or a way to hate herself)
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(...)
- vens. bebemos duas águas tónicas. depois vais, se tens de ir...
- mas é tão tarde. onde estás tu?
- estou em casa.

ela estremeceu. de surpresa. como se fosse uma carícia. "falaremos, de novo, sem nada dizer, estonteados. inclinarei, de novo, o pescoço para o lado direito para dar lugar à tua boca. tapar-te-ei a cara com a almofada. dir-te-ei, muitas vezes, para não te mexeres. quando fechares os olhos eu passarei os dedos nas tuas pestanas. eu vou, espera por mim, eu vou..." - pensou.


mas disse:
- sempre quis conhecer a tua casa. a maneira como te sentas na tua sala. o teu à-vontade na tua casa de banho. o sítio onde arrumas os sapatos. coisinhas assim, fundamentais...e é agora que me convidas para ir...
- convido. so what?
- é tão tarde.
(...)

e não foi.

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09 Novembro 2006

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