
31 Agosto 2006
Tactear o transitório. Ser fulguração. Sentir o esgar da revolta, da ironia, do espanto...
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sonhos estranhos, os desta noite
meio eróticos, sem princípio nem fim
tu no meio e eu a rir de mim
com medo de me mexer
estamos a ser revelados na câmara escura
assim te quero e protejo
de tudo o que pensas conhecer
ainda não estou suficientemente consistente - confiável
posso deitar tudo a perder
que pensarás tu, dentro do teu sono?
a vida é um risco muito mal feito
e o passado uma palavra
que se esqueceu de olhar em frente
mas olha
proponho-te um amor que desconheço
e se conseguir despir-te e despir-me de palavras
pode ser que te ofereça, hoje, a minha vida inteira
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30 Agosto 2006
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(...)
Eles, a gente que trabalha nos telhados,
jamais o confessarão, mas conhecem
a cor do céu.
Sabem que não é azul sobre as aves.
A gente que trabalha nos telhados, essa gente sim
tem verdadeira vertigem.
A gente que trabalha nos telhados não poderia trabalhar
num night-club, ou entre as quatro paredes de um café.
Pelo gesto que desenham
ao suspeitar que uma telha possa estar solta,
intuímos que, numa vida não tão distante, podem ter sido
indecisos professores de tango.
A gente que trabalha nos telhados odeia
as horas de ponta, evita aglomerações,
como se a multidão, os autocarros, o odor a leucemia
ou a palavra demasiado tivessem a culpa da sobrecarga,
de que o mundo se despenhe pouco a pouco
pelas suas fissuras de barro.
A gente que trabalha nos telhados sai de madrugada
desconfia até das ruas vazias.
Não são estáveis as avenidas no interior dos seus olhos.
E nas poucas vezes que se aventuram a descer
antes de deixar o passeio e pisar a passadeira de zebra
comprovam primeiro, com um pé,
a dureza do asfalto,
temerosos de que um rio gelado
possa quebrar-se sob os seus pés.
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Harkaitz Cano
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29 Agosto 2006
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20 Agosto 2006
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13 Agosto 2006
Como homenagem a Fernando Lopes Graça, no ano do centenário do seu nascimento.
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Mas também porque me lembrei de gritar o mesmo mote a quem ainda acredita na quase desarmante candura dos dois novos senhores do mundo ao elaborarem, tão oportunamente (demasiado oportunamente), estas conspirações contra si mesmos, como a de ontem. Acordai!
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11 Agosto 2006
11 Agosto 2006
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a pele nada revela, nada esconde. respira apenas por todos os poros do devir. há quantos anos as nossas peles roçam um destino que não sabíamos e nunca saberemos?
quando digo que contorno os teus lábios, são fragmentos de um texto que construo. os teus lábios ficarão inteiros como a minha pele em todos os naufrágios.
assim me reclamo e espero por nós.