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Queria estar bem próxima do mar para perceber as brumas, metaforizadas no silêncio enevoado da minha casa, em dias nos quais nada nem ninguém perturbam a calma contundente de não se fazer nada, enquanto o mundo lá fora acontece singular.
Singular é a maneira como percebo que desaconteço, ferida na tentativa vã de sobreviver às certezas transitórias de uma vida-armadilha, entre lânguidos sussurros, e a sensação aborrecida de querer ser rocha, oceano; desde os píncaros dum zénite azulado até o fim dum horizonte nadir.
Entre um querer e outro eu escondo-me, eu pairo, eu recrio-me. Improviso divertimentos, pequenas artes, folguedos. Estouro da vontade que eu sempre quis. A pressa compelida de calma, cama, ócio dos apaixonados.
Sede: hemorrogia do avesso. Tantas maneiras de se criarem estes contrários iguais. No fundo não me importa se é sede o que sinto, derramo sempre.
Eu só queria ter até o fim dos meus dias esta inspirada fé em nadas, fazer cócegas na apatia e ser feliz.
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10 Dezembro 2005
2 comentários:
Ser feliz é fácil. O pior é o resto. Brinco. Brinco?
Quem brinca assim também, como você, é o meu querido José Gomes Ferreira. Refiro-me à sua expressão «Sede: hemorragia do avesso». Merece a comparação com o poeta. Também mereceria ser feliz mas não sou eu quem manda – dizem que é deus… É pena.
nunca me poderia comparar com josé gomes ferreira, de quem também gosto muito. da exteriorização das minhas coisinhas à obra dele vai uma distância abismal.
eu não sei bem como se poderá definir felicidade. contrário de infelicidade? mas eu não me situo em nenhum desses extremos, o que é esquisito para uma pessoa extremada, como eu.
também não é o momento nem a soma dos momentos. creio que é mais a eternidade do momento em nós.
li, num filme, uma frase de um pai para a filha: "só vivi com a tua mãe 22 meses, mas foi o bastante para encher a minha vida".
por qualquer motivo aquilo tocou-me. deus pode mandar mas não fala assim...
:)
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